hoje mandei daquelas coisas que se metem numa máquina e desaparecem para serem vomitadas noutra máquina, no meu caso em Portugal, Lisboa, FCSH. não consigo compreender tal complexidade, é algo que ultrapassa a nossa percepção, ou pelo menos a minha. acho mesmo um grande acto de magia.
hoje passeei à chuva.
os pés fazem ploft, o cabelo pinga,
hoje passeei à chuva.
há sons que só hoje se fizeram ouvir, cheiros que só de hoje posso recordar,
hoje passeei à chuva.
o chão escorrega e as gotas caem por todo o lado, as pessoas correm para não serem molhadas, os limpa pára-brisas balançam num som frenético, há luzes de bombeiros e um brilho que nunca vi.
hoje passeei à chuva. e hoje entreguei-me à chuva.
Gosto de me empuleirar no parapeito da janela da sala, fico encostada, descalça. sinto-me numa fronteira qualquer entre o estar/não estar. nao, nao tenho o mar do outro lado, nem uma montanha imponente, nem sequer uma vista resplandecente da cidade, é so um predio horrivel cor de tijolo gasto, feio, sem janelas e portadas dignas de Bologna. Vejo os carros e as motas e as bicicletas, ou continuam ou páram no semáforo. às vezes nao se apercebem e eu posso olhar muito as pessoas; às vezes olham para cima e sorriem ou abanam a cabeça, às vezes metem-se comigo e inicia-se uma conversa de malucos enquanto estão parados no semáforo, primeiro porque eu tou cá em cima e eles la em baixo e nao consigo ouvir muita coisa,depois porque o meu italiano gritado é uma mistura de dialectos imperceptíveis. pode estar frio la fora, mas não importa. também olho pra dentro, neste lugar posso-me mover rapidamente entre o estar/não estar. dentro de casa eles continuam a falar, participo, agora já nao, viajei. gosto do círculo que se forma no lado de dentro da sala, gosto dos olhares e dos gestos, gosto de os observar na elegância coreográfica das conversas, são as mãos, os lábios, abstraio-me do som, oiço melhor os corpos. as vozes de dentro ecoam lá fora, nao me apercebi. podia ficar ali horas como pêndulo a oscilar entre um interior/exterior. depois deixo este corredor hibrido e já faço parte do circulo à volta da mesa e participo nessa dança que nao acaba nunca.
Não esperava que o meu blog fosse esta desgraça atrasada. Ainda não ha net na Via delle Lame, 47, primer piano, só no cantinho do Luis e mesmo assim quando eu chego lanço umas vibrações muito negativas e a net do vizinho cai. A da biblioteca, da bela sala Borsa quando eu chego tambem nao funciona, resta-me ficar de rabo no chão frio e duro da piazza Maggiore a rezar para que a bateria do meu portatil cansado nao se va logo abaixo. mas ta quase a morrer. O meu ultimo post data de dia 11 de setembro, hoje estamos a 6 ou 7? 6 de Novembro.... bahhh!!! Ah mais uma coisa o meu disco externo nao funciona, dada a pequena capacidade de armazenamento do meu disco faltam-me milhentas fotos. resultado: viva os cds virgens!
Apetece-me escrever tudo, ou quase tudo, vou anotando recortes dos dias no papel. Já passaram 2 meses e 7 dias. Festas, passeios, Ferrara, Milão, Florença, Cinqueterre, Veneza, Verona, Bologna, Bologna, Bologna, minha querida Bologna, visitas dos pais e do namorado, pessoas e mais pessoas, já amigos, já aulas, já apontamentos num mixed italianol, já livros por comprar e estudo pra começar, frizzantino, limpezas, lavatrice que funciona mal, roupa que nao seca com a chuva, churrasco, uma grande bebedeira, saudades, dias cinzentos, banda Erasmus, guitarras e vozes pela casa, a nova bicicleta, a nova bicicleta alterada, a bicicleta pintada, o chão e o telemovel e os sacos grandes do ikea e quase as sapatilhas do Pedro, confissões, desabafos, sorrisos, lágrimas escondidas, conversas intermináveis que passam pelo ingles, frances, portugues e italiano...